15 setembro 2002

Anos podem passar sem reparar naquele olhar...



Anos podem passar sem reparar naquele olhar...



Um dia sem esperar encontrei os teus olhos… de repente.

Já sabia que gostava de ti.
Nunca antes tinha pensado porquê.
Talvez uma certa familiaridade
na maneira muito peculiar de seres quem és.

Pensei em tocar-te a mão
enquanto falavas entusiasticamente da tua angustiosa viagem
sobre um mar de água,
a lembrar que afinal até já estávamos no Outono.

Nunca antes te olhara assim.
Pensei depois,
que talvez nunca te tivesse olhado no fundo dos teus olhos,
quase negros.

Tenho reparado mais em ti nos últimos tempos,
talvez porque tenhamos tido mais tempo para conviver
ou tenhamos descoberto
que afinal sempre existem muito mais pontos em comum do que pensávamos.

Afinal,
tu até me fizeste confidências acerca de alguns desgostos recentes
e que me fizeram lembrar o meu próprio passado recente.

A descoberta do teu olhar doce ... e ... uma trovoada.
O teu sorriso ingénuo e são...
Perdi a força nas pernas.
Esqueci-me do resto do mundo
e ali fiquei só para te ouvir e fiquei, fiquei, fiquei
e gostava de ter ficado muito mais tempo.

Se tivesse intenções de falar,
em vez de te ouvir,
ficaria certamente sem palavras.
Num repente angustiante perdi-me nos teus olhos,
reparei pela primeira vez que tinhas as sobrancelhas muito delineadas
e quase negras.

Nunca tinha reparado em ti e já te conheço há tanto tempo.

Como os anos passam por nós e tantas vezes,
demasiadas,
não reparamos nos olhos ou nas mãos de alguém.

Tens uns dedos tão delineados e finos.
Parece que as tuas mãos são uma continuação da expressão de ti.

Nunca reparo se as pessoas são fisicamente interessantes.
Quando reparo,
faço-o porque descobri o olhar que mostra a sinceridade dos ingénuos.

Tens uma alma sincera e sedutoramente carinhosa.

Os teus olhos espelham alguma dor escondida.
Mas, és doce!
Cheiras a margaridas!
Acho que as margaridas não têm cheiro,
mas imagino que se tivessem cheiro tu cheirarias a margaridas.

Trazes-me serenidade…
A tão ansiada paz interior.
Quando penso em ti invade-me uma estranha calma
como aquela que só o mar o transmite.

Quando estou contigo não tenho nada a perder,
confio em ti.
Isso é extremamente raro.
Não me fazes sentir sozinha como outros já o fizeram.
E não há pior,
do que alguém que consegue fazer com que nos sintamos sozinhos.

Antes sozinhos connosco próprios
e de preferência que sejamos uma boa companhia,
do que estar com alguém que não nos deixa sentir,
ou que não nos deixa ser quem somos.

Muitas vezes por culpa nossa.

Mas, tu és diferente.
Eu sei que és uma alma sincera, eu sei…!
Como?
Não sei explicar, mas que és, és!

O meu instinto não me engana.
A franqueza ingénua salta à vista de qualquer um!
É por isso que a tua alma é tão pura!

Sabes?

Os olhos a espelhar mágoa
podem mostrar esse teu lado tão profundamente são.
As almas francas guardam sempre alguma mágoa por serem incompreendidas.

Alguns pensam – Que grande chatice!
As pessoas que brincam ao jogo do gato e do rato são muito mais interessantes.

A mim não me interessa!
Existem outros jogos divertidos e muito menos “trapezistas” emocionalmente.
Só os ingénuos têm essa capacidade de franqueza,
apenas os ingénuos.

Sabem que podem magoar
(e isso dói-lhes!),
mas têm a coragem de dizer o que pensam
e demonstrar o que sentem!

Pessoalmente, gosto muito destas pessoas!
São tão inacreditavelmente raras que é uma bênção conhecê-las!

Só mesmo os ingénuos têm intacta a capacidade de sonhar!
O meu receio é que quem perdeu já essa capacidade
pode tornar-se irreversivelmente magoado e frustrado
(não estou a utilizar a expressão mais adequada).

Só os ingénuos têm a capacidade de cometerem os grandes feitos!
Até então nunca se aperceberam que eles eram impossíveis de concretizar!
E no fim afinal o impossível não existiu!

Naquele momento em que finalmente reparei que existias…
pensei:
Que sonhos tens?
Afinal, quem és tu?
O que é que queres?

Provavelmente, nem tu saberás!

Se fores como eu deixas-te ir na maré
e de quando em vez dás umas braçadas para a frente,
para os lados ou até para a retaguarda.

Mas, tu não és assim.
Tens quase tudo organizado para não existirem imprevistos.
Há-os sempre para darem cor à vida e um brilhozinho aos teus olhos!

Mas,
como é que se passaram tantos dias e dias
sem nunca me ter apercebido que estavas ali?

Por preconceito,
pensei que talvez fossemos demasiadamente diferentes.
Outros próximos de nós fizeram o mesmo em relação a mim!
E tu?

Já me chegaram a dizer:
Mas afinal, tu até és parecida connosco! Temos muito em comum.

Fui eu que estive muito entretida a manter-me fechada no meu mundo,
na minha redoma de vidro,
no meu casulo durante demasiado tempo.
Eu já sabia que tínhamos muito em comum,
mas tive medo de mostrar quem realmente sou!

Agora mostro mais!
Agora sou mais eu!
Finalmente, já não estava a ver a hora.

Por causa de tudo isso perdi a vossa companhia durante anos.
Mas parece-me cada vez mais
que encontro uma razão de ser para que isso tivesse acontecido.

Espero não perder mais tempo!
Já perdi mais que suficiente.

Quando te vir da próxima vez vou ter que te olhar bem no fundo dos olhos!
Talvez um dia descubras os meus!
Eu espero!
Tenho muito tempo…,
quero dizer tempo não sei se tenho,
mas tenho paciência,
muita paciência...

Nesse dia,
talvez nesse dia,
consiga tocar a tua mão,
ou talvez sejas tu a procurar a minha.
E talvez nesse dia eu toque a tua alma
e isso seja só o primeiro passo para te amar.

Outono de 2002


Um dia apercebi-me que deixei de ter tempo.

Outras coisas aconteceram,
outro alguém apareceu...
Um dia teve a coragem de tocar a minha mão...
Atrevi-me a procurar a sua...
nos dias seguintes... que já são alguns ...
conseguiu tocar a minha alma... como ninguém antes fizera...
E isso foi o primeiro passo para AMAR.


Verão 2003

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