08 janeiro 2004

Este é um sinal do teu desespero... do meu e do teu...



Este é um sinal do teu desespero... do meu e do teu...


Não estou sozinha, não...
Mas há qualquer coisa...
Há qualquer coisa que me faz sentir só...

Há muitos anos...
Tantos...

Será que um dia deixarei de sentir assim?

Quando tudo parece encaminhado,
algum aspecto da minha vida,
vens tu.
E como que num prazer masoquista e sádico...
tiras-me um bocado...

Não consigo nunca estar bem,
nem contigo, nem sem ti... esta é definitivamente uma relação perversa...
Cheia de dor, uma dor que por vezes é insuportável...
As minhas vísceras estão revoltas,
como a minha mente, não....
Como a minha alma...

Acho que és o único ser humano capaz de me fazer sentir tão só,
porque raios preciso de ti de uma forma doentia... doentia... doentia...

És uma ameaça à minha sanidade...
Não sabes o que queres...

Tu já viste que no fundo,
bem lá no fundo de ti,
não sabes o que queres,
o que pretendes da tua vida.

Por isso presumo que não sabes que és...assim...

Não consigo compreender...

Como é que tu, que és tu, não sabes quem és?
Como é possível?
É perverso! É definitivamente perverso! é muito perverso!
É horrivelmente perverso.... e triste,
porque eu não sou horrivelmente como ele,
sou antes horrivelmente como tu...

Estas palavras estão cheias de repulsa..
Leio-as e estou-me a ver a mim na tua posição.
Estou angustiada! Estou desesperada! Tanto!
Sinto-me perdida! Não quero ter esta necessidade doente de ti!

Não quero sentir que ele não está cá
para lhe dizer que não o quero ver mais,
que quero que ele morra dentro de mim.
E quero! Quero tanto que ele morra dentro de mim!

Nunca mais vou ter Paz! NUNCA!

Dói-me cá dentro! Dói-me tanto!



Estou aqui numa varanda à 1 hora da manhã,
como há um ano e meio,
quando comecei a escrever estas insónias.

Estou à luz de velas,
com o computador,
sem cigarros e sem calor.

Está muito frio.

Estou em Lisboa,
numa espécie de varanda envidraçada,
com vista para o Campo Grande.
Vejo luzes até onde começa o céu.
Umas verdes, outras amarelas, também vermelhas.


Vejo o relógio do Campo Grande,
daquele prédio ao lado da churrasqueira.
Está a piscar,
deve informar sobre as horas,
a fantástica temperatura invernal
que sentimos quando pomos o nariz fora da janela
e talvez a data e um anúncio a uma seguradora.
Já é tradição... aquele relógio ali,
há tantos anos como eu cá estou, talvez até mais.

Lá em baixo a linha de comboio,
sem o dito.

Já é tarde.
Poucas luzes nos prédios aqui em frente.
Está uma noite aparentemente calma e gelada.
Mas sem vento.

Aqui sinto-me mais em casa
do que alguma vez supus que me iria sentir.
Há muito que não escrevo assim, as insónias...

Não tenho conseguido atingir o estado de alma,
suficientemente nostálgico,
para escrever até já não ter forças para desligar o computador.

Sinto a alma a soltar-se do corpo.

Geralmente, este estado adivinha forças para seguir em frente,
desbravar novos caminhos.

Sinto-me a partir para lá,
mas ainda não arranquei.

Preciso de um precioso empurrão que não sei de onde virá.

Mas ele virá.... certamente que virá...

Não sei onde me leva, nem qual é o caminho a seguir,
mas sei que irei algures e tomarei o meu caminho lento,
penosamente lento, demasiadamente lento...

A vista só é bela qual a partir do Campo Grande.
A Avenida que leva ao aeroporto está demasiado próxima.
Percebo ainda os contornos dos autocarros.
Lá para depois do Campo Grande,
isso sim é beleza - as luzes no pano de fundo no negro.

Lisboa não dorme nunca. Os automóveis não param.

Paro e olho... À procura de um ponto de equilíbrio,
de um ponto de encontro com o meu eu eternamente perdido,
confuso na barafunda do que ainda não enfrentei
e é o que de mais me pesa,
talvez....

Mas não encontro.... esse ponto está dentro de mim
e não lá fora da janela.

Vou agora dormir.... mais leve dos meus pesadelos acordados...


Numa varanda de Lisboa
Janeiro 2004